Nesse 25 de Julho, dia do escritor, inicio as postagens neste blog com o primeiro conto que deixei devidamente registrado.
Resolvi mantê-lo inalterado, imaculado e inocente como minha escrita original no ano em que o escrevi, em 2013. Portanto, ignore a imaturidade.
Era mais uma manhã de Sol avermelhado. Quando meu despertador soa toda
manhã é o sinal que faz pulsar meu coração. Ergo meu corpo na cama,
sentado com visão para a janela. Meus binóculos estão na cômoda; tomo-os
as minhas mãos. Seis horas da manhã é o horário em que a vizinha do
apartamento em frente ao meu chega depois de sua jornada de trabalho.
Eu tenho 12 anos, mas já sei o que se passa. Sei que ela é uma
prostituta. Comprovei isso graças ao intenso número de homens que entram
e saem do apartamento dela. Ah, e eles gritam o nome dela, foi assim
que descobri que ela se chama Rose. Mas eu não ligo para esses homens.
Ela sempre aparece reluzente nesse horário, geralmente chutando um novo
homem bêbado para fora de seu quarto depois de uma noite agitada.
A
observo já faz dois meses e sempre a vi da mesma forma. Olhos pesados,
como se nunca dormisse (e imagino porque não dorme), maquiagem borrada,
um lindo cabelo dourado e bagunçado, e o que mais me intriga: ela nunca
sorri. Seus lábios com batom intensamente vermelho, manchado e
escorrendo pelo queixo, nunca se curvam no que eu imagino ser o sorriso
mais lindo do mundo. Meu sonho é ver o sorriso de Rose pelo menos uma
vez na minha vida.
Mas neste dia tudo estava diferente. Rose
apareceu na janela, mas não havia botado um homem para fora. Ela estava
enrolando copos de vidro em jornais e colocando-os delicadamente em
caixas de papelão. Olhei para a calçada de seu apartamento e vi um carro
bege caindo aos pedaços parado. O capô estava aberto e dentro dele
repousavam duas maletas surradas, um amontoado de roupas saltando para
fora delas e uma caixa de papelão amassada sobre o peso de uma das
maletas.
Rose desceu as escadas com pressa, pois em segundos após
sumir da janela ela surgira saindo pela porta da frente do prédio,
colocando a caixa de papelão no chão. Jogou uma maleta para o canto do
porta-malas e pressionou as roupas soltas contra ela. Ajeitou um pequeno
lugar e colocou a caixa com cuidado.
Mil coisas passaram pela minha
cabeça. Sim, mudança. Jamais veria Rose de novo? Eu precisava fazer
algo. Saltei da cama e senti meus joelhos estralarem. Se Rose fossem
embora eu jamais veria seu sorriso e eu mesmo teria uma vida triste para
sempre. Abri a porta do meu quarto e corri. Nunca fui nenhum atleta, e
acho que aquilo poderia me matar, mas desci as escadas na velocidade da
luz. Estava tão desajeitado quanto um pinguim, sentia cada pedaço da
minha perna se aquecer, como se eu estivesse deitado em uma chapa.
Pensei logo em comprar uma lembrança para ela. Meti a mão no meu bolso,
mas lembrei que estava de pijama e só tirei alguns fiapos e o que
parecia ser uma bombinha para asma.
Então avistei um canteiro de
flores na entrada do meu prédio. Nem vi direito, mas puxei a primeira
flor que achei. Que feliz coincidência, era uma rosa. Corria muito
rápido e apertava aquela flor como se minha vida dependesse disso. Por
um instante senti os espinhos furando minha mão, mas nem me importei.
Vi que Rose estava entrando em seu carro e dando a partida. Foi então
que caí de cara no capô. Minha mão estralou no metal e fez cair um
punhado de ferrugem. Rose se assustou e desligou o carro. Agora eu
estava frente a frente com ela, e nunca tinha feito isso antes. Estava
tão cansado e emocionado que nenhuma palavra saia da minha boca. O que
consegui fazer foi erguer meu braço e lhe entregar a rosa, depois sorri.
Pensei que iria desmaiar ali mesmo naquele momento. Vi Rose sair do
carro e pegar a flor, cheirá-la e então esboçar o mais lindo sorriso que
já havia visto. Venceria qualquer modelo famosa neste quesito. Então
tudo veio a minha cabeça. Meus pés descalços doíam por caminhar no
asfalto quente, minhas pernas estavam me matando com a dor mais
excruciante que já havia sentido, minha mão sangrava, meus olhos se
apertavam, mas eu só conseguia ver aquele sorriso. O sorriso de Rose.
Mais brilhante que o Sol avermelhado. Acho que desmaiei naquela hora.
Foi quando me lembrei de dois meses atrás, do acidente em que um carro
me deixou quase paraplégico. Fiquei sozinho no meu quarto, e meu pai me
deu binóculos para observar a rua, até arrastou minha cama para isso.
Lembro-me dos médicos falando que minha recuperação seria muito lenta,
ou quase impossível. E eu tenho asma também.
Depois que desmaiei no
carro de Rose eu só acordei horas depois no hospital. Os médicos falaram
que foi uma recuperação milagrosa, e que algo realmente importante me
teria feito correr daquele jeito. Foi quando me recordei de Rose. E
chorei.
Nunca mais vi Rose, nem o seu sorriso, desde aquela cansativa manhã de Sol avermelhado.
Sabe quando as coisas parecem escuras, tristes, mas apenas um sorriso é capaz de iluminar tudo? Aquilo que transforma o seu dia para melhor, anima os momentos que sozinho e naturalmente seriam muito chatos. Valorize esse sorriso. E faça de tudo para que ele nunca mais desapareça.
Até a próxima postagem!